quinta-feira, 21 de agosto de 2008

Bala perdida

No final dos anos 80, quando a expressão bala perdida apareceu na mídia, critiquei-a veementemente junto aos colegas jornalistas do Jornal do Brasil. Pouco depois, em O Dia, continuei com a crítíca. Por quê? Porque tal termo possibilita a que não acha empenho nas investigações policiais decorrentes, pois já se definiu que o crime foi por "bala perdida". Estas palavras, bala perdida, surgiram primeiramente nos telejornais e nos programas policiais do radiojornalismo carioca. Creio que foi a televisão quem primeiro as usou. A TV trabalho mais a imagem do que o conteúdo do assunto crime. Casos policiais sem imagens dos atos criminosos (ou dos que cometeram o crime) ou das vítimas, assim como dos policiais em ação, não geram ibope e, para crimes em que a TV não chegou à cena no momento em que ele ocorreu, o linguajar comum dos policiais criou tais termos: "bala perdida". Portanto, criadas pelos policiais nas entrevistas à mídia eletrônica, as palavras se incorporaram ao jarguão jornalístico, com grande prejuízo para a posterior apuração dos crimes, principalmente pela perícia criminal. A título de ilustração, vou dar um pequeno exemplo de como isso é danoso. Há uns oito anos, em Vila Isabel, uma criança de 6 anos foi morta no playground de seu condomínio enquanto brincava. O diagnóstico do crime: "bala perdida". Contudo, inconformado com isso, o pai da criança, um advogado, contratou os serviços de um perito-policial aposentado que começou a investigar. Para começar: derrubou a indicação de que a bala que matou a criança partira do Morro dos Macacos. Seria preciso que a bala desse suas curvas até chegar à pequena vítima. E olha que o morro estava distante, a uns 2km do local. A bala do crime partira de um revólver e fora disparada por um cidadão neurótico de guerra que morava em andar alto de um prédio próximo e que tinha o hábito de se exasperar com a algazarra das crianças. Não fosse o pai, o crime seria arquivado como de autoria desconhecida, por bala perdida. Esta expressão deveria de ser banida das reportagens policiais, pois para todo o crime há uma autoria. E os policiais sabem disto. Mas bala perdida acomoda para muita coisa, ou gente.

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